segunda-feira, 13 de abril de 2015

O revisor Baudelaire: Les erreurs du mal


Um livreto de 1848, que trazia um texto de Edgar Allan Poe traduzido por Baudelaire, foi destruído a pedido do tradutor por causa de um erro em seu nome. Na capa se lia “Beaudelaire”. Talvez esse evento tenha gerado uma preocupação incurável, quase enfermiça, de Baudelaire pelas erratas. Ele, descuidado com todas as suas coisas, tornou-se implacável. Corrigia pessoalmente. Mudava-se para perto da tipografia durante o período de edição de um algum de seus livros. Vigiava, pedia provas constantes. Depois do martírio desse afã de correção, a edição de As flores do mal saiu com erratas. Algumas perturbadoras, como a mudança do título de um poema, ou vie por ville. Essas erratas têm criado largas discussões entre os críticos e um elemento de imprecisão em certos poemas. O leitor, apesar do trabalho denodado de Baudelaire, ignora realmente o que disse o poeta em alguns versos. Após sua morte, as primeiras provas corrigidas por sua mão infatigável foram levadas a leilão público. Foram vendidas por 40 mil francos, valor que ele não ganhou em toda a sua vida.

(ARRUFAT, Antón. De Las Pequeñas Cosas. Valencia: Editorial Pre-Textos, 1997, p. 142-143)

Provas corrigidas de Flores do mal (1857) com diversas anotações de Baudelaire

Em dezembro de 1856, quando seu relacionamento com Michel Lévy, o editor de suas traduções de Poe, estava passando por um período difícil, Baudelaire repentinamente recorreu a Auguste Poulet-Malassis, um jovem publicador de Alençon, na Normandia. O poeta confiou ao seu futuro amigo a tarefa de imprimir e publicar um livro de poesias, em sua maior parte composto por textos reunidos durante os últimos cinco anos, e que, até então, só haviam aparecido em periódicos. Poulet-Malassis tinha a reputação de ser um editor honesto e também – o que seria o fator decisivo – um tipógrafo de categoria. A intenção era montar um livro, insistia Baudelaire, “uma obra de material bom, apesar de escasso, que parecesse substancial e fosse bem apresentado”. Uma vez que o manuscrito, preparado por um copista, tinha desaparecido, juntamente com quase todo o conjunto de provas tipográficas corrigidas, que provavelmente estavam manchadas demais para serem mantidas, essas provas de prelo são, hoje, o único documento que nos permite reconstruir a gênese de As flores do mal, da remoção da primeira dedicatória a Théophile Gautier, em 8 de março de 1857, até as últimas correções, realizadas na segunda metade de maio. Entre idas e vindas entre Alençon e Paris, elas comprovam o cuidado atento do autor para com a ortografia (moderadamente tradicional), a pontuação (de acordo com o significado, mas também com a “declamação”) e o layout. Elas registram as perguntas e os pedidos de Poulet-Malassis (raivosamente rabiscadas por Baudelaire) para corrigir e devolver rapidamente as últimas provas tipográficas. Além disso, as anotações do poeta e algumas recomendações são evidência de sua tensão nesse período crucial e da ansiedade que o tornava indiferente com relação à exasperação do editor que ele tinha escolhido, como ele o lembrava, porque ambos compartilhavam da ideia de que “em qualquer tipo de publicação, nada mais é admissível a não ser a perfeição”.

(THE EUROPEAN LIBRARY. Corrected page proofs of Les Fleurs du mal. 6 mar. 2014. Disponível em:
 <http://www.theeuropeanlibrary.org/tel4/record/1000093325392>. Acesso em: 2 abr. 2015).