domingo, 13 de abril de 2014

O dedo médio em riste na literatura latina

Il dito, escultura de Maurizio Cattelan, em Milão, Itália.


[...] O aspecto mais surpreendente é que certos gestos significam a mesma ideia, materializam o mesmo pensamento, nas regiões mais distantes e diversas do mundo. A linguagem não conseguiu esta universalidade. [...] O dedo malévolo é o médio. Pérsio, poeta satírico da Roma Antiga, o denomina infami digito (Sátira, II, v. 33). Era o dedo com que as feiticeiras misturavam as essências mágicas. Mox turbatum sputo pulverem medio sustulit digito, descreve o prosador Petrônio em Satyricon. Com poeira e saliva, a velha romana fez o unguento que passou na testa do herói pretoniano, usando o dedo médio. Significa o membro viril.


O poeta latino Marco Valério Marcial, em epigrama contra Sextilo, cita o gesto deste, mostrando-lhe o dedo médio como resposta às suas malícias: digitum porrigito medium. Em epigrama dedicado a Marciano, lembra que este zombava com o dedo impudico, signo obsceno: ostendit digitum, sed impudicum.


Anterior a todos esses era Plauto, o dramaturgo. Na comédia Pseudolus, há uma cena típica do costume. Quando Hárpax procura Bálio, alugador de prostitutas, está com ele Simão. Ouvindo o recado de Hárpax, Simão informa, decisivo: “Ó homem da clâmide, defende-te dessa funesta aventura. Mostra-lhe o dedo! É um prostituidor!”.


O gesto continua contemporâneo.


(CASCUDO, Luís da Câmara. Superstições e costumes. Rio de Janeiro: Antunes & Cia., 1958, com adaptações)