quinta-feira, 28 de março de 2013

Se Cazuza fosse revisor

http://www.youtube.com/watch?v=cBAZDJmbUb0


A norma culta fede
A norma culta quer ditar língua
Enquanto houver norma culta
Não vai haver poesia

Pobre de mim que vivo da norma culta

Sou revisor mas não sou mesquinho
Eu também cheiro mal
Eu também cheiro mal

A norma culta não dá valor à fala

Da vendedora de chicletes
A norma culta só olha pra si
A norma culta só olha pra si
A norma culta é a direita, é o purismo

Vamos pra rua!

Vamos pra rua!

Vamos acabar com a norma culta

Vamos dinamitar a norma culta
Vamos pôr os gramáticos na cadeia
Num gueto de variantes estigmatizadas
Eu sou revisor, mas não sou purista
Estou do lado do povo, do povo!

sexta-feira, 22 de março de 2013

Olavo de Carvalho errando o alvo

Nota do autor Olavo de Carvalho em seu livro “A Filosofia e seu Inverso” (2012).


A leitura da nota acima mostra que o autor — por desinformação ou tendenciosidade? — comete o mesmíssimo erro de várias pessoas que associam a instituição do Novo Acordo Ortográfico ao governo do Lula/PT como se isso fosse uma iniciativa da tal esquerda que se encontrava então no poder.

O novo Acordo Ortográfico foi um tratado elaborado e discutido entre 1986 e 1990 pelo dicionarista Antônio Houaiss (por parte do Brasil) e representantes de outros países de língua portuguesa. Isso nem mesmo era algo original ou inovador porque copiava, em larga medida, o acordo ortográfico de 1945 (firmado entre Brasil e Portugal, mas seguido apenas pelos lusos porque os brasileiros se sentiram prejudicados e voltaram a usar o acordo anterior), no qual já eram propostas a abolição do acento agudo nos ditongos abertos das paroxítonas e a extinção do trema, mudanças que já estavam em prática em Portugal desde a década de 1940. Como se vê, trata-se duma demanda histórica internacional, que atravessou gerações e que não foi, de modo algum, iniciativa mirabolante dum governo esquerdista em pleno século XXI.

É ÓBVIO que os interesses e as motivações por trás do novo Acordo podem e devem, sim, ser questionados. Direito de contestar e criticar isso é algo que o Olavo de Carvalho tem — e aliás com muita razão —, porque foi um tratado porcamente aprovado pelos especialistas e que não passou por nenhuma revisão por aqueles que se encontravam à frente do negócio (a ABL de Evanildo Bechara). Nem os dicionaristas, gramáticos, linguistas e professores de português concordam com o modo como os articuladores atuais entregaram o texto do Acordo, que precisava duma série de correções, atualizações e adaptações. Entretanto, seu conteúdo não é obra de políticos e dirigentes (nem foi por eles discutido!), mas de academicistas; o decreto deu força de lei ao Acordo, mas NÃO o planejou e nem o elaborou. Era algo que já se encontrava redigido há 20 anos, na época em que Lula disputava uma eleição presidencial pela primeira vez.

Querer jogar a responsabilidade disso no governo em 2009, que só endossou e aprovou por meio de decreto o que qualquer outro governo teria feito naquele momento, é pura forçação de barra, para não dizer estupidez. O que faz Olavo de Carvalho acreditar que, estando Serra, Alckmin ou qualquer outro líder com formação escolar superior no lugar de Lula, o decreto não teria sido assinado do mesmíssimo jeito? Que justificativa, opinião ou embasamento técnico um outro presidente, no lugar do Lula, encontraria para barrar, em 2009, este acordo internacional e não assinar o decreto? Se os próprios acadêmicos que propuseram a decretação do acordo não apresentaram restrições e impedimentos, o que faz Olavo raciocinar que qualquer outro político que não fosse o Lula, de qualquer partido ou orientação, apresentaria?

Olavo de Carvalho está atirando no alvo errado. Se existe alguém a quem deve ser imputada a responsabilidade por um acordo ter sido instituído da forma como está, este alguém é a Academia Brasileira de Letras, representada pelo gramático Evanildo Bechara, que assumiu a "criança" deixada por Houaiss.