Para os que visitam o tantas vezes recitado Goiás Velho, a Vila Boa de Goiás, é dada a chance de descobrir, por meio de simpático busto debruçado à janela, o lar de sua mais famosa doceira. A vontade imediata é poder logo adentrar, folhear a intimidade do livro da vida daquela senhora – preservado em forma de museu – e ouvir a guia contar as estórias de Cora entrelaçadas à história da Vila.
Mas repentina insatisfação surpreende o viajante sedento de registros: o interior da casa é proibido retratar... Resta-lhe então buscar – tal qual fez a poeta – os temas que a inspiraram nos arredores da residência e da cidade. E é sem esforço que nos deparamos com estórias sendo contadas bem ali, na ponta de nossos pés, a partir das ruas de pedra; mais adiante, na beleza remota das igrejas coloniais; e se ousarmos bater às portas, continuamos a saber mais pelos contos das vizinhas doceiras, enquanto preparam guloseimas.
E assim se experimentam as sinestesias que inspiravam poemas e contos: saboreando, no rio que margeia a casa, a deliciosa sonoridade; ouvindo, no verde do quintal, a silenciosa serenidade; visualizando, nas iguarias das vizinhas, a imortal doçura.
Quem lê Cora também vê a Vila. E estar na Vila é ler Cora. Para o viajante, passeio se torna leitura; e seus passos, versos.
Voltemos a reparar agora o busto senil à janela: seria mesmo preciso? Ora, em vez da mera escultura, por que não deixar que descubram sua essência por meio de todos os doces, verdes e pedras que testemunham a mais cotidiana criação literária daquela vila?
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